domingo, 3 de julho de 2011

Não tão fácil.

Ouvi certa vez que o amor pode ser dividido em três fases: na primeira, você se desespera internamente, anseia cada segundo ao lado daquela pessoa, acredita mesmo que o amanhã não existe se aquela pessoa não estiver no horizonte. É nessa mesma fase que você se arrepia só de ouvir a voz do outro, que tem a perfeita ilusão de que não existe pessoa mais perfeita no mundo inteiro e também é a fase dos impulsos telefônicos constantes. À essa fase deram o nome de paixão, disseram também que nela você se encontra tão preenchido de expectativas que não vê quem o outro realmente é.

A segunda fase abraça aos poucos a realidade - lembre-se de que isso não pode acontecer de uma vez, pois é perigoso para a integridade do que estamos descrevendo aqui -, põe primeiro um braço e, vagarosamente, começa a esticar o segundo; sempre hesita. É nela que você pensa estar se encontrando novamente, quando, na verdade, está mergulhando no outro: esse abraço representa o momento decisivo.

No primeiro braço você acha que está se anulando demais em nome do outro e acredita que, de alguma forma, isso pode ser deprimente ou até mesmo agressivo para si. O segundo é muito mais lento, porque ao mesmo tempo que você pensa na sua situação, você também está pensando no que o outro é, em outras palavras, você começa a perceber que o ser idolatrado é só outro ser humano como tantos lá fora - e os defeitos desse ser começam a te afetar, mas não é como se eles não afetassem desde o início, é porque durante o abraço você se colocou como o foco e o outro foi para o ponto da observação.

O que acontece quando o abraço da realidade se cumpre? Eu diria que existem dois casos principais: aquele, mais comum, que entende que o que é mais importante para ele é ele mesmo definitivamente e que a melhor coisa é: ou terminar ou começar a anular mais o outro em nome de si; e o mais raro que percebe que, da mesma forma que os dois braços foram necessários durante o abraço, ele vai, da mesma forma, precisar do outro tanto quanto o outro precisará dele. Ele não precisa anular ninguém, pode simplesmente deixar que o outro o complete.

Os sobreviventes do abraço, de ambos os casos mais comuns e dos mais raros, pertencem à terceira fase. É nela que o nosso interlocutor diz que nasce o amor egoísta e o amor maduro. Aquele possui uma vítima, uma mulher ou homem que vê que o amado o humilha, discrimina, desconsidera; mas que está sempre ali tentando manter um sorriso no rosto, porque afinal ela ou ele não sabe que não é como se o outro não lhes amasse muito, é só que ele escolheu a si próprio.

O amor maduro também possui mini fases do egoísta, mas ele tende a sempre retornar a compreensão mútua: nele você aceita os defeitos alheios e faz-los tão seus quanto dele sem se perder, nele toda discussão é um amadurecimento necessário para que os laços continuem se tocando mais e mais até terem se apertado o suficiente, nele há tanta dor quanto fruição - são artifícios necessários no fortalecimento desse tipo.

Tanto o egoísta quanto o maduro são os tipos de amores que encontramos hoje naqueles casais que ficam muitos anos juntos, tantos anos que, ainda jovens, perguntamo-nos como que essas pessoas conseguem se suportar durante tanto tempo. A diferença básica existe no seguinte fato: no egoísta tudo que lhe toca o enfraquece, é um relacionamento estável por medo, conforto, condicionamento, rotina... no maduro, por sua vez, tudo o fortalece.

Não há regra sobre a duração das fases, ou mesmo sobre o inquestionável acontecimento mútuo de mais de uma fase com outra, esse é só um panorama pintado por uma pessoa que ouvi certa vez que amava e que ama muito.

É evidente que crescemos acreditando na carapuça da paixão travestida de amor, que dizer que o amor maduro é raro é otimismo - porque tá muito além de extinto -, e que a tendência de uma sociedade individualista é priorizar o indivíduo e, portanto, o seu egoísmo, o que não espanta a quantidade crescente desses tipos de casos e das desistências cada vez mais acentuadas.